terça-feira, 6 de novembro de 2012

Memórias...

Ao partilhar no Facebook uma ligação sobre o aniversário da morte de Sophia de Mello Breyner, como quase sempre que ouço o nome dela, recuei 12 anos atrás e voltei aos tempos do liceu...

 É curioso como vamos mudando ao longo dos anos... No secundário detestei a poesia dela. Invariavelmente, lembrei-me de entrar em pânico no exame nacional de Português porque, azar dos azares, saiu um poema dela para analisar. "
As fontes". Impossível esquecer!
 
A nossa professora tinha-nos facultado dois ou três poemas de cada um dos autores estudados para nos prepararmos para o exame. Todos na sala pareceram satisfeitos. Eu entrei em pânico. A verdade é que a irreverência dos 17 anos tinha-me impedido de estudar Sophia para o exame nacional. Se não gostava, por que raio haveria de estudar?

Enquanto os outros viravam já a página, eu continuava ocupada com a leitura do poema. Uma e outra vez. A nota do exame podia deitar por terra a minha entrada para a universidade. Português era específica, a par do Latim. Na altura, os exames de Português A eram constituídos apenas por três questões e a análise textual valia 100 pontos, se não me falha a memória. Apesar do peso da culpa por não ter olhado sequer para os poemas analisados de Sophia, lá me enchi de coragem e fiz o melhor que sabia.

À saída, fiquei a saber pelos comentários dos colegas que o tema do poema era a busca da realização através do amor ou algo do género. Eu jurava que tinha acabado de analisar um poema sobre a vida depois da morte.

Passei alguns dias angustiada, à espera do resultado. Quando chegou o grande dia, a J. ligou-me para me dar a boa nova. Vá-se lá saber como, tive 17,1 ou 17,2 no exame nacional (já lá vão uns anitos, a minha memória é boa, mas não é assim tanto).

Não sei se pelo susto que apanhei, se por ter lecionado Sophia logo no ano de estágio, mas, agora, longe da irreverência dos 17 anos, é uma das minhas poetisas de eleição.

Na verdade a vida muda-nos. Aprendemos a ver o que nos rodeia com outros olhos e vamos evoluindo. Normalmente para melhor. Estamos mais atentos aos pormenores e menos preocupados com os nossos caprichos. Mas ainda hoje, 12 anos depois, deixando de lado todos os clichés, pedagogias e didatismos sobre a autora, continuo a achar que “As fontes” falam sobre a vida depois da morte.

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Em ponto de ebulição IV



Há dias (provavelmente no ano passado) recebi em casa um postal de boas festas da Porto Editora que me deixou emocionada.

"Obrigado pela sua paixão, pela sua dedicação e pela sua coragem. Obrigado por nos mostrar o mundo. Por nos abrir os olhos. Por nos fazer pensar, imaginar e sonhar. Obrigado por cada aula. Pelas letras e pelos números. Pelos pensadores, construtores e pelos inventores. Obrigado por nos mostrar o caminho e por caminhar ao nosso lado. Obrigado por ensinar as nossas crianças. Por abrir horizontes a Portugal."

Por estranho que pareça, é muitas vezes sem contar que nos apercebemos do orgulho que sentimos na profissão que escolhemos para nós. É nestas alturas, em pequenos momentos como este, que sentimos que todo o esforço valeu a pena e que nada foi em vão.

Reli o postal e todas as linhas me pareceram perfeitas. Quer enquanto ex-aluna, quer enquanto professora.

Enquanto aluna, também eu tenho de agradecer a alguns professores que marcaram a minha vida, de forma bastante positiva. Porque eram pessoas especiais. Porque eram professores especiais. Alguns, as duas coisas.

Enquanto professora, apesar de ainda não ter chegado aos 30, noto uma diferença abismal entre os alunos "do meu tempo" e os alunos de agora. Há dias em que, apesar de toda a paixão e cuidado com que preparo cada aula, de regresso a casa sinto-me desiludida e derrotada. Vulgarmente culpam-se os colegas mais velhos, os colegas anteriores, que não faziam não sei o quê e agiam de determinada forma e graças a eles os professores caíram no descrédito.

Eu sinto-me tentada a culpar os alunos. Alguns. Que têm o poder de nos desmotivar e até de nos fazer desistir deles.

De facto, para ensinar, é preciso "paixão", "dedicação" e "coragem". Muita coragem.